O passado às vezes volta, entrando por uma janela que a gente mesmo deixou entreaberta. Ele espreita nossos erros, nossos medos, nossas angustias e de repente se nos revela, assim, do nada, com os braços abertos e aquele sorriso cínico, indigesto, como quem diz: “Como você se atreve a sonhar ser feliz sem mim???”
Minha Fraqueza me faz retribuir o abraço, mesmo cheio de repulsa, mesmo com o estomago embrulhado… abraço meu verdugo viajante do tempo e por um momento quase peço desculpas pela minha ousadia, pelo meu atrevimento, pela minha desobediência.
A verdade é que, não fosse ele, o meu passado, parte irascível de mim, o repeliria dizendo: “Quem pensas que és para querer tirar-me a esperança de ser melhor do que fui???”.
Mas a Lembrança, protetora do meu passado, surge como um cão enfurecido e grita: “Ei!!! Tudo que ele fez, fez com você, junto contigo, com sua permissão, em conluio!!!”.
“Como expurgá-lo, como enterrá-lo, como ceifá-lo de meu presente sem arrancar um pedaço de mim?”, pergunto. “Ele é a brisa que vai virar chuva para humedecer minhas plantas ou a tempestade que destruirá meu jardim? Ele é o raio de luz que iluminará meus sonhos ou o cogumelo radioativo que alimentará meu pior pesadelo? Ele é sopro que se transformará em vento para içar as velas do meu destino rumo a calmos mares ou a ventania que me arrastará de vez para as minhas profundezas?”
Abraçá-lo-ei sim, mas não como quem a um amigo recebe, ou contra um inimigo conspira; simplesmente com a calma de quem se despede de alguém que nunca conheceu, com a fugacidade da saudade do que nunca se viu… e não pedirei perdão por ousar, por querer ser feliz sem ele, apenas lastimarei não poder vir comigo, pois ele é como o velho sábio que ensina, mostra o caminho, acena de longe, mas permanece no mesmo lugar, parado, referência do que já fui e que não quero tornar a ser; inspiração para ser melhor do que seria se dele não lembrasse mais…
Cristian Menezes 04-2018



