quarta-feira, abril 8

Ensaio: Heróis de Ontem, Heróis de Hoje

                                                                        Paweł Kuczyński - Desenhista e pintor polaco

Houve tempos em que heróis singravam os mares nunca antes navegados em busca de novos mundos; parcos exércitos contra um sem-número de inimigos, três centenas contra dezenas de milhares a defender com lanças e escudos o indefensável, uma guerra já perdida; cavaleiros intrépidos investiam contra o que viam pelas frestas de suas armaduras reluzentes a respingar honra e gloria em nome de reinos invisíveis; alexandres erguiam alexandrias sobre almas pagãs; pequenos pilotos em grandes aeronaves silenciavam guerras com gritos de desespero e dor. Grandes feitos, alguns gloriosos outros nem tanto, mas sempre por um bem maior, um ideal que parecia valer a pena para tantos.
Os heróis de hoje travam outras batalhas, em outras guerras e com outras armas. Singram os mares da própria consciência, não em buscam de novos mundos, pois todos já foram explorados, buscam a si próprios; não mais poucos contra muitos, são todos contra todos por sabe-se lá o quê; investem uns contra os outros despudoramente despidos de quaisquer virtudes, sem honra, sem glória; pelas frestas das armaduras de hipocrisia só se veem moinhos de esperanças que insistem em ficar de pé, mesmo golpeados; joãos, josés, marias não erguem nada, nada constroem que se dignem empostar seus nomes; todos são pilotos, todos são alvos dentro de dantesca e única nave decadente e contaminada, só os gritos ainda ecoam em suas mentes.
O herói de agora é aquele que, apesar de tudo, consegue chegar ao final com os seus ao seu lado. A batalha é para manter a dignidade, o próprio respeito. Os inimigos são a cobiça, a ganância, a deslealdade, a falsidade e os falsos profetas, que vociferam contra vícios aos quais eles mesmos sucumbiram, que se afogam em águas que antes, no início, juraram manter-se distantes.
Somos todos desgarrados soprados pelo Minuano carregado de saudade. Viramos copos, viramos mundos, mas nunca mais nada será como antes, profetizou o poeta. Como na antiguidade, a pitonisa veio, e vem, em forma de pele, osso e grandes orelhas, sem passado e sem presente, e ninguém entendeu, e entende, a mensagem, pois não estava nas palavras balbuciadas em um castelhano etílico, mas na imagem de si mesmo. O que dizia a mensagem? “Eu sou você amanhã”. E ninguém estava, e está, lá quando a hora dele chegou, e chega, como havia e há de ser. Um herói desgarrado, ou um desgarrado que sonhou, no final, ser herói?
Desgarrados agora somos todos nós. E o que o vento traz é só a lembrança de quando todos se sentavam em torno da távola retangular imensa, de madeira, com tampo espesso, a esperar pela sopa de ossobuco com Milharina servida em pratos fundos enfileirados no parapeito da janela, pela pizza feita na forma de fogão com tampa com garras de filtro de ar de carro velho, pela carne assada bem passada, quase queimada e a maionese sem maionese.
Desgarrados, náufragos em um mar de incertezas fitando, ao longe, pequenas ilhas, terra-firme, cujos olhos marejados não permitem, sequer, distinguir se são reais ou apenas miragens.

Por Cristian Menezes 2019

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