terça-feira, novembro 13

Ciência para a longevidade


Não se engane. A ciência como a conhecemos hoje nasceu para tornar-nos humanos longevos e não humanos melhores. Há, aparentemente, um paradoxo entre qualidade de vida e longevidade. Holisticamente falando, qualidade de vida tem a ver com convivência, coexistência, ética, meio ambiente, ecologia, sustentabilidade e tanto outros aspectos da “vida humana” que não constam, necessariamente, do vocabulário científico.
Talvez o problema não esteja propriamente na ciência, mas na visão que foi construída dela ao longo dos tempos. Os egípcios mumificavam seus faraós para que eles chegassem ao outro mundo, no mundo dos mortos, onde viveriam para sempre com suas pompas e dotes físicos e/ou intelectuais intactos. Os alquimistas, na busca pelo elixir da vida eterna, desenvolveram, por acidente, fórmulas que no futuro se transmutariam em eficazes medicamentos. Mesmo os físicos, em sua luta secreta e obstinada pelo que viria a se chamar medicina, visavam a cura para os males que à época afligiam a humanidade, menos para tornar o homem mais humano, mas mais para torna-lo supra-humano, imortal, por assim dizer.
Esperamos da ciência a cura, o “conserto” para nossos defeitos morais, para nossa ganância, nosso individualismo, nossa mediocridade, nossa pequenez, nosso niilismo travestido de ideologia capitalista…, mas a ciência não está aí para isso. Pensamos que como ela nos fez chegar à lua, decifrar o código genético, produzir a Dolly, reconstituir tecidos, transplantar órgãos, gerar energia do núcleo de uma célula…poderia, também ou à medida em que, nos transportar a mundos subjetivos dentro de nós mesmo, nos decifrar, nos reproduzir melhores, reconstituir nossos significados, transplantar nossas esperanças, gerar uma energia do âmago de nossos desejos mais sombrios que acendesse em nós uma chama perene de altruísmo…mas a ciência nunca serviu a isso, não serve a isso e talvez nunca venha a servir a isso.
Aquilo que a ciência produz, nem sempre nos torna melhores e, por vezes, e não raras vezes empobrece nosso espirito e afronta nossas melhores expectativas. Os meios de que abre mão para chegar a determinados fins nem sempre são justificados, e mesmo o fim a que se chega é garantia de sucesso, pois aqui, numa espécie de limbo ético em que se colocou ou colocaram a ciência, longe dos olhos críticos de uma lisura pragmática, apofântica, sucesso sequer é, necessariamente, sinônimo de júbilo, prosperidade, esperança, proficuidade.
A ciência é imanente. Cria ferramentas, mas não escolhe quem as usará nem como, a ciência facilita a existência, mas não impõe a quem a existência será facilitada, a ciência busca, mas não se sabe bem o que, para quem ou mesmo quando. Como panteões do conhecimento, oráculos de um futuro somente imaginável nos prostramos e reverenciamos aqueles que fazem a ciência, como se fossem eles mestres de uma sabedoria superior, atemporal, metafisica, quando, na verdade, por debaixo dos jalecos alvos tremulam apenas mais de nós mesmos, seres temerosos pelo porvir, decepcionados pela incongruência entre o muito que pensam saber e o infinito do que têm certeza que há,  que, se em algo diferem de nós, não-cientistas, é apenas em não aceitar, não se submeter e até indignar-se ao irremediável e incontestável fato de sermos apenas o que somos: humanos demasiado humanos.

Por Cristian Menezes em 10/2018

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