Houve
tempos em que heróis singravam os mares nunca antes navegados em busca de novos
mundos; parcos exércitos contra um sem-número de inimigos, três centenas contra
dezenas de milhares a defender com lanças e escudos o indefensável, uma guerra
já perdida; cavaleiros intrépidos investiam contra o que viam pelas frestas de
suas armaduras reluzentes a respingar honra e gloria em nome de reinos
invisíveis; alexandres erguiam alexandrias sobre almas pagãs; pequenos pilotos
em grandes aeronaves silenciavam guerras com gritos de desespero e dor. Grandes
feitos, alguns gloriosos outros nem tanto,mas sempre por um bem maior, um
ideal que parecia valer a pena para tantos.
Os
heróis de hoje travam outras batalhas, em outras guerras e com outras armas.
Singram os mares da própria consciência, não em buscam de novos mundos, pois
todos já foram explorados, buscam a si próprios; não mais poucos contra muitos,
são todos contra todos por sabe-se lá o quê; investem uns contra os outros despudoramente
despidos de quaisquer virtudes, sem honra, sem glória; pelas frestas das
armaduras de hipocrisia só se veem moinhos de esperanças que insistem em ficar
de pé, mesmo golpeados; joãos, josés, marias não erguem nada, nada constroem
que se dignem empostar seus nomes; todos são pilotos, todos são alvo dentro de
dantesca e única nave decadente e contaminada, só os gritos ainda ecoam em suas
mentes.
O
herói de agora é aquele que, apesar de tudo, consegue chegar ao final com os
seus ao seu lado. A batalha é para manter a dignidade, o próprio respeito. Os
inimigos são a cobiça, a ganância, a deslealdade, a falsidade e os falsos
profetas, que vociferam contra vícios aos quais eles mesmos sucumbiram, que se
afogam em águas que antes, no início, juraram manter-se distantes.
Somos
todos desgarrados soprados pelo Minuano carregado de saudade. Viramos copos,
viramos mundos, mas nunca mais nada será como antes, profetizou o poeta. Como
na antiguidade, a pitonisa veio, e vem, em forma de pele, osso e grandes orelhas,
sem passado e sem presente, e ninguém entendeu, e entende, a mensagem, pois não
estava nas palavras balbuciadas em um castelhano etílico, mas na imagem de si
mesmo. O que dizia a mensagem? “Eu sou você amanhã”. E ninguém estava, e está,
lá quando a hora dele chegou, e chega, como havia e há de ser. Um herói
desgarrado, ou um desgarrado que sonhou, no final, ser herói?
Desgarrados
agora somos todos nós. E o que o vento traz é só a lembrança de quando todos se
sentavam em torno da távola retangular imensa, de madeira, com tampo espesso, a
esperar pela sopa de ossobuco com Milharina servida em pratos fundos
enfileirados no parapeito da janela, pela pizza feita na forma de fogão com
tampa com garras de filtro de ar de carro velho, pela carne assada bem passada,
quase queimada e a maionese sem maionese.
Desgarrados,
náufragos em um mar de incertezas fitando, ao longe, pequenas ilhas,
terra-firme, cujos olhos marejados não permitem, sequer, distinguir se são
reais ou apenas miragens.
Por Cristian Menezes em 9/2018
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