Para eu, reles mortal
e observador do mundo, a diferença entre Fé e Razão nunca esteve tão gritante
desde julho de 1789, auge da Revolução Francesa. Tomando como ponto de partida
o pensamento do americano H.L. Menvhekn de que fé é “uma crença ilógica naquilo
que não se pode provar”, e a do filósofo Pascal de que razão seja “a
consciência intelectual e moral da percepção das coisas” surgiu um paradoxo na
minha cabeça com os últimos acontecimentos no País.
Primeiro temos o caso
João de Deus. Um monstro com a alcunha de “de Deus” flagrado com armas, 50
milhões de reais em dinheiro em malas e bancos, 1,6 milhão de reais em pedras
preciosas escondidas em diversas propriedades e inimagináveis 40 anos de
prática da “fé” que estão resultando em cerca 6oo relatos de abusos sexuais recebidos
pela Promotoria de Goiás, sendo que destes pelo menos 255 considerados de
supostas vítimas, destas, 23
tinham entre 9 e 14 anos na ocasião dos fatos, 28 entre 15 e 18 anos, e
70 com idade de 19 a 67 anos, entre elas, a própria filha que teria sido
abusada desde os 10 anos de idade. Para tentar se livrar das grades contratou
um dos mais requisitados, e caros, advogados criminalistas do País, Alberto
Toron.
Do outro lado da
lâmina que lacera até a mais profunda fé, os relatos vergonhosos de abusos
sexuais de crianças, adolescentes e, agora, freiras de uma Igreja que, em nome
de Deus, vem há décadas acobertando toda essa promiscuidade fazendo jorrar rios
de dólares, euro, franco suíço, reais entre outas moedas de várias nações que,
fraternalmente, abriram suas portas ao cristianismo católico e toda sua
sordidez. Vemos um Papa, o Bento XVI, acuado, porém resignado em fazer alguma
coisa, mas pressionado e, logicamente, temeroso por, depois de todos os
esforços para tentar uma “limpeza” ética-moral na Milenar Congregação, acabe
como tantos outros que o antecederam, que por bem menos que isso amanheceram
espumando pela boca e tendo espasmos simples e comodamente diagnosticados como
parada cardíaca, mais uma.
Agora imaginemos uma
notícia hipotética, uma notícia fake como chamamos. Um restaurante famoso e com
décadas de tradição é autuado pela Vigilância Sanitária depois que agentes de
saúde descobrem que o principal ingrediente dos cozinheiros, o “tempero
secreto” era, nada mais nada menos, que sêmen desidratado dos próprios metres.
E o dono sabia, mas como o movimento era grande, sempre fez vistas-grossas para
o tempero exótico. “Ecaaaaa” diria um frequentador do restaurante, que jura de
pés juntos nunca pô-los mais naquele lugar “nojento”. O desenrolar do caso é
demissão em massa, fechamento do estabelecimento, funcionários e proprietário
indiciados por algum tipo de crime e por fim alguns deles sendo conduzidos para
a cadeia.
Agora, numa comparação
absurda, vejamos. Por que que no caso do restaurante os fregueses ao tomarem
conhecimento dos “abusos” dos chefes se revoltam e, de cara, abandonam o
estabelecimento e no caso do João e da Igreja os “salões” continuam legalmente
abertos e lotados? Por que os envolvidos diretamente, no caso os cozinheiros,
são punidos com demissão imediata e sansões legais, e no caso do João e da
Igreja tudo continua como sempre, aquele bando de gente vestindo o branco da
pureza com terços nas mãos e almas maculadas e negras, manchadas pela culpa do
silêncio, da omissão? Por que que no caso do restaurante, o proprietário tem
observado sua parcela de culpa na atitude de seus subalternos mesmo sem um
envolvimento direto, e no caso do João e da Igreja, o Chefe Maior, Ele, não é
sequer cogitado como sendo, pelo menos, corresponsável por nada? Ninguém sequer
questiona “como Ele pôde permitir isso?”
Pois eu questiono.
Como Ele pôde permitir isso? Tamanha atrocidade com tanta gente inocente e em
nome Dele, dentro da Casa Dele? Um atentado contra uma pessoa feita por um
clérigo, uma “pessoa de Deus” é infinitamente pior do que o mesmo atentado
feito por um ‘mundano’, um laico. É como um assassinato cometido por um morador
de rua analfabeto e um assassinato cometido por um advogado. O advogado é muito
mais culpado que o mendigo, porque este sabia exatamente a extensão de seus
atos e suas punições, aquele não. Um estupro praticado fora dos muros de uma
instituição religiosa machuca o corpo e fere a alma da vítima. Mas um abuso
praticado dentro destes mesmos muros, em que se acredita serem oásis no deserto
de toda maldade do mundo, destrói o corpo e mata a alma, pois arranca de dentro
do peito a única coisa que faz com que o ser humano possa superar tamanha
crueldade: a esperança.
“Usava de forças do
bem para fazer o mal”, li numa reportagem de uma respeitada revista de
circulação nacional, uma argumentação defensiva no caso do João. “Eles são
tirados de suas igrejas, do convívio com seu ‘rebanho’ e são banidos para lugares
distantes”, argumenta o Alto Clero. Lugares distantes? Distante de onde, de
que, de quem? Distante das grandes capitais? Quer dizer que os padre pedófilos
que abusaram de crianças e adolescentes em São Paulo, Rio de Janeiro são
enviados para, sei lá, Rondônia? Ji-Paraná, talvez? E por que cargas d’água
isso vai resolver alguma coisa? Aqui não tem crianças e adolescentes suscetíveis
ao ataque destes monstros? Ou pensam eles, os magnatas de bata, que a pedofilia
está ligada ao clima, à posição geográfica com relação à Linha do Equador? Ao
fuso horário? Estupra em Belo Horizonte, mas não estupra em Ji-Paraná porque o
clima não favorece? Sinceramente…valha-me Deus…
Por Cristian
Menezes – 12/03/2019

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